Paraná lidera a contratação de seguro rural. Veja o que está por detrás do avanço deste mercado e os desafios futuros

A falta de chuvas no início de dezembro do ano passado – período de enchimento dos grãos de soja – soou como um péssimo presságio ao produtor rural Itamar Carraro, de Toledo, no Oeste do Paraná. Diante da estiagem e do tempo quente, ele sabia que mais uma quebra de safra estava por vir. As perdas se concretizaram na colheita: a produtividade ficou em torno de 20 sacas por hectare, ante a média histórica de 65 sacas.

“A perda na minha lavoura passou de 60%. Só não fiquei no prejuízo, porque tinha seguro. Três apólices”, diz o produtor. “Em janeiro [de 2019], eu já acionei o seguro, os peritos fizeram o levantamento e em 45 dias o dinheiro estava na minha mão. De tudo que perdi, fui indenizado”, acrescenta o produtor, que, com o ressarcimento, pôde planejar o plantio do milho safrinha.

Aos 52 anos de idade, Carraro cresceu na lavoura e, ao longo das décadas, se cansou de ver agricultores ficando à míngua por causa de desequilíbrios climáticos. “Naquela época, se tinha perda, o produtor tinha que bancar do bolso. O meu pai, mesmo, sofria muito naquele tempo”, lembra. Por isso, Carraro prefere não correr riscos e passou a encarar o seguro rural como uma etapa tão imprescindível ao seu negócio, quanto obedecer às épocas de plantar e colher. Essa proteção já o livrou de outras perdas.

“Em 2017, veio uma chuva de pedras. Eu perdi 100% da lavoura. Tudo. Mas também estava segurado”, conta. “Eu faço seguro de tudo o que eu plantar. Para mim, pelo menos, dá uma segurança, porque chuva e seca são coisas que a gente não controla”, observa.

Perspectivas

O grupo de produtores que, assim como Carraro, estão protegidos pelo Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) do governo federal ainda é considerado pequeno, mas aumentou bastante ao longo da última década. E as perspectivas são alvissareiras: o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) está brigando para mais que dobrar os recursos destinados a subsidiar o seguro rural. Com isso, o volume injetado pelo governo saltaria dos R$ 440 milhões liberados no ciclo atual para R$ 1 bilhão na safra 2019/20.

Na prática, a intenção do Mapa de aportar mais dinheiro pode ser encarada como a retomada de uma visão que contempla o seguro rural como um instrumento estratégico de segurança na atividade rural. A subvenção vinha aumentando até 2014, auge do programa. Naquele ano, o Brasil atingiu o recorde de mais de 117 mil apólices, com 73,5 mil produtores cobertos e com quase R$ 690 milhões em subsídios. No entanto, no ano seguinte, o programa sofreu um corte severo, com recursos e apólices reduzidos em dois terços (veja o infográfico).

“Naquela gestão, não se entendia o seguro rural como um programa de Estado e preventivo. Não houve o entendimento de que era uma área sensível, não só aos produtores, mas ao próprio país”, observa Pedro Loyola, que desde janeiro é diretor de gestão de riscos do Mapa. “Agora, o ambiente é outro. A nossa visão é clara: a gestão de risco agropecuária é estratégica para o Brasil. É prioridade”, acrescenta.

Avanço

Apesar dessa “quebra” no fluxo de recursos ocorrida em 2015, o programa avançou de forma aguda. Desde 2006, o número de apólices decolou 158%, chegando a 63,5 mil contratos ao longo do ano passado. O valor da lavoura e do rebanho segurados é, hoje, mais de três vezes maior, chegando a R$ 12,6 bilhões cobertos pelo programa. Com o aumento previsto da subvenção para a nossa safra, espera- -se que o seguro rural passe a ser mais atrativo a mais produtores.

Um estudo do Mapa aponta que a procura por apólices de seguro rural chega a ser o dobro do número de contratos registrados ao longo do ano passado. Ou seja, se a oferta de subsídio aumentar, a tendência é que o seguro passe a ser acessível a uma fatia maior de agropecuaristas. “Por isso estamos brigando por maios recursos no orçamento federal”, reforça Loyola.

A possibilidade da liberação de mais dinheiro federal para subvencionar o seguro rural foi bem recebida pelas corretoras. As empresas mencionam o peso que os subsídios têm em gigantes do agronegócio, como Estados Unidos, onde o seguro rural é disseminado e que têm 90% de suas lavouras cobertas por apólices. Mesmo em países onde o seguro é relativamente recente, como China e Índia, as subvenções chegam, respectivamente, a US$ 2,5 bilhões e US$ 1,5 bilhão. Recebem, portanto, um investimento maciçamente maior que o do Brasil.

“É uma unanimidade que a subvenção no nosso país precisa ter um apoio muito maior. Isso é fundamental para que o produtor possa contratar mais e, por conseguinte, se chegar a um seguro melhor, com maior proteção e previsibilidade. Tem que ser visto como uma política de Estado”, ressalta o consultor em seguros rurais Luiz Antonio Digiovani.

“Esse anúncio da ministra [da Agricultura Tereza Cristina] é fundamental para que os produtores possam acessar, cada vez mais, o programa. Estimamos que para atender todos os produtores que já contratam seguro, sem expansão, seriam preciso, no mínimo, R$ 800 milhões”, diz Paulo Hora, diretor técnico de Seguros Rurais da Brasilseg, uma empresa BB Seguros.

Distribuição

Na safra 2018/19, cerca de um sexto da área cultivada no Brasil está protegida por seguro rural. Pelo PSR, a cobertura chega a 4,6 milhões de hectares. A maior fatia (em torno de 75%) dos subsídios e do número de apólices se concentram em lavouras de grãos. Isso porque o país é um grande produtor de culturas como soja e milho, bastante suscetíveis a desequilíbrios climáticos.

Não por acaso, o Paraná lidera com folga o mercado de seguros rurais, concentrando mais de 40% das apólices contratadas no ano passado. Quase todos esses contratos (97,4%) dizem respeito a seguros para lavouras de grãos. No total, mais de 1,5 milhões de hectares estão cobertos no Estado, com valor segurado que passa da casa dos R$ 3 bilhões. No mapa nacional de seguros rurais, Rio Grande do Sul (com 21,3%) e São Paulo (com 15,3%) também aparecem com participação expressiva.

Alguns aspectos contribuem para isso de forma decisiva. Um deles é que a estrutura de seguro rural já está bastante assentada na região Sul do país, onde a logística complicada, que envolve uma rede de dados confiáveis de segurança climática e peritos capacitados, já está consolidada. Soma-se a isso o fato de a prioridade para a subvenção se dar por data de entrada do pedido junto ao Mapa.

“O produtor que faz o contrato mais cedo tem chance maior de ter subsídio aprovado. Pelas etapas de plantio, no Paraná se começa mais cedo. Mas não é só isso. O Paraná foi um dos pioneiros. Já existe toda uma estrutura e uma cultura de seguro rural. Algumas seguradoras concentram atuação no Sul e mantêm acordos com cooperativas. No Centro-Oeste, por outro lado, essa percepção de risco e de proteção é mais recente”, aponta Digiovani.

Para Paulo Hora, os dados revelam a necessidade de aperfeiçoamento de mecanismos de desconcentração dos subsídios aos seguros rurais a outras regiões do país. Grandes produtores agropecuários, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais, juntos, somam o equivalente a 13% das apólices assinadas no Brasil. Em outros 19 Estados, o índice de contratos não chega a 1%.

“A mecânica de distribuição pode ser aperfeiçoada e contemplar aspectos que permitam de forma mais equânime o acesso de todas as regiões produtoras ao programa, com os devidos critérios relativos a maior ou menor necessidade do porcentual de participação da subvenção. Hoje, as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste ficam prejudicadas neste aspecto”, avalia Hora.

Uma bandeira de duas décadas

Ao longo dos últimos meses, a FAEP deflagrou uma série de ações reivindicando um aporte de R$ 150 milhões do orçamento de 2019 ao Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural. Está longe de se tratar de uma iniciativa isolada. Pelo contrário. Para a Federação, a luta para que o seguro rural se consolide como uma política de Estado já tem mais de duas décadas.

“A gestão de riscos é um tema que nos é prioritário. Trabalhamos sempre com informações qualificadas, para mostrar aos produtores do nosso Estado que o seguro rural precisa fazer parte da nossa atividade de forma estratégica, minimizando riscos e zerando eventuais prejuízos decorrentes de oscilações climáticas”, aponta o presidente da FAEP, Ágide Meneguette.

A atuação da Federação começou ainda na década de 1990, quando, a partir de uma série de visitas técnicas a países que são referência em gestão de riscos, técnicos da entidade trouxeram informações relevantes sobre o modelo de seguro rural implantando nessas nações.

Paralelamente, a FAEP promoveu seminários e caravanas para levar informações aos agropecuaristas do Paraná. Em 2008, por exemplo, a FAEP organizou um seminário, que contou com a participação de técnicos do Mapa e de especialistas de instituições, como a Universidade de São Paulo (USP). A partir do encontro, a Federação elaborou uma proposta técnica para a consolidação do seguro rural no país. O seguro de faturamento só foi desenvolvido pela atuação direta da entidade.

“É sempre importante ressaltar que o desenvolvimento do seguro rural sempre foi uma demanda da FAEP e isso ajuda a explicar porque isso já é uma cultura no Estado, com tanta participação neste mercado. É uma conquista que só existe por causa da FAEP”, aponta o consultor em seguros rurais Luiz Antonio Digiovani.

Quem contrata seguro rural há muitos anos reconhece a evolução dos produtos e a importância da ação institucional neste processo. “Antes, era uma coisa incerta. A agente contratava, não são sabia se ia ser indenizado no valor certo. Agora, tudo é claro. E sempre a gente conta com a força da FAEP, que sempre traz informações claras, incentiva o produtor e trabalha junto às seguradoras para melhorar os seguros”, afirma o produtor rural Itamar Carraro, que inúmeras vezes já recorreu ao seguro rural.

 

 

Escrito ou enviado por Sistema FAEP/SENAR-PR

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